quarta-feira, 19 de junho de 2013

Não atrapalhem o trânsito

 
 
Do blog do Leandro Fontes:
Um dos discursos mais comuns à direita brasileira é esse: peçam o que quiserem, digam o que quiserem, mas não façam baderna. E, sobretudo, não atrapalhem o trânsito. Não por outra razão, qualquer cobertura da mídia nacional sobre passeatas, manifestações e grandes movimentações de massa acabam, sempre, em manchetes de trânsito. Os camponeses foram a Brasília pedir reforma agrária? Atrapalharam o trânsito. As mulheres da Marcha das Margaridas invadiram as Esplanada dos Ministérios para pedir saúde e educação no campo? Provocaram engarrafamentos. A moçada parou São Paulo para reclamar do aumento da tarifa do transporte público? O promotor mentecapto, parado no trânsito, pede a PM para espancar e matar os manifestantes. Afinal, o filhinho dele está na escola. Mas como chegar para pegá-lo a tempo, se os bárbaros impedem o trânsito?
(...)
Para o usuário de transporte coletivo, todo dia tem confusão e baderna, mas é difícil explicar isso para o mundo da Avenida Paulista. Para a classe média bem motorizada, as demandas do transporte coletivo são subterrâneas, confinadas a um universo específico sobre o qual só se tem notícia quando motoristas e cobradores entram em greve. É o dia em que a patroa de Higienópolis se inquieta porque a empregada vai chegar mais tarde ou, horror dos horrores, nem vem trabalhar. Quem vai fazer almoço? E os petizes, sob a guarda de quem ficarão no playground?
(...)
Então, todos se unem contra a baderna. Podem pedir o que quiserem, podem se manifestar, cruzar as ruas com bandeiras, mas, por favor, não atrapalhem o trânsito. Políticos de todos os matizes se unem para bradar: baderna, não! Antigos militantes de esquerda que ainda acham um lindo momento histórico as barricadas de Paris, em 1968, estão, ora vejam, revoltados com a baderna.
(...)
Manifestantes são franceses, suecos, turcos, chineses. No Brasil, são vândalos e desocupados interessados em depredar o patrimônio público, como se a imprensa brasileira, hoje povoada de engomadinhos formados em cursinhos de trainee, alguma vez tenha se preocupado, de fato, com a segurança física dos ônibus usados pelos pobres.
Perdão, gente indignada com os vândalos. Mas entre a hipocrisia e a baderna, eu fico, alegremente, com a segunda.

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