Valor 02/01
A partir de hoje, os cerca de 13 milhões de servidores públicos brasileiros vão poder escolher livremente o banco no qual querem receber seus salários. É o início de uma disputa entre instituições financeiras que já dá pistas de que pode chegar ao bolso dos correntistas.
Para enfrentar o assédio dos concorrentes sobre sua clientela e para conquistar novos correntistas, os bancos já montam pacotes de serviços com redução de tarifa. Hoje, o Santander coloca no ar uma campanha com promoções, que incluem tarifa zero e cartão de crédito sem mensalidade para os assalariados. No Rio, o Itaú Unibanco já faz contrapropostas para os 460 mil servidores estaduais que passaram hoje a ter conta no Bradesco - que, procurado, preferiu não se pronunciar. O Banrisul, que tem uma base de 500 mil funcionários públicos, também monta novas tarifas. E a Caixa vai isentar de tarifas na cesta básica de serviços por um ano os servidores que optarem por receber pelo banco.
Não é um público qualquer que está em questão. São trabalhadores que ganham R$ 2,3 mil por mês, enquanto a média brasileira é de R$ 1,6 mil, segundo dados do Ministério do Trabalho. Só em crédito consignado, aquele com desconto direto na folha de pagamento dos trabalhadores, os servidores consomem R$ 136 bilhões de uma carteira total de R$ 160 bilhões.
"Acho que vai ter uma competição muito acirrada daqui para a frente", afirmou Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco em entrevista recente ao Valor. "A hora que você permite essa competição mais direta, o beneficiário maior será o correntista, que poderá receber ofertas mais agressivas dos bancos."
Para as instituições, está claro que o preço das tarifas vai cair. Porém, o menor preço que os clientes vão pagar não necessariamente pode se reverter em queda de receitas para as instituições. Além do custo das transações, os bancos avaliam que também vão contar outros quesitos, como qualidade do serviço e oferta de crédito. "Se prestarmos um bom serviço, vamos gerar mais resultado". Não estamos pensando em reduzir", disse Pedro Coutinho, diretor-executivo de varejo do Santander.
Essa nova competição que começa em torno dos clientes não significa, porém, que os bancos ficarão completamente livres de uma outra disputa, que se dá nos leilões promovidos por Estados e municípios por suas folhas de pagamento. A percepção dos executivos ouvidos pelo Valor é que essas disputas milionárias vão se reduzir, mas não acabar. Isso porque ter o cadastro do cliente, com renda, telefone e endereço facilita a conquista dele. Mesmo não garantindo que o cliente manterá o dinheiro na conta depois de o banco pagar milhões ao Estado ou município, dados valiosos estão em jogo. Mas que podem passar a valer menos com o início da portabilidade.
E não é só isso. Muitas vezes, só quem ganhou a folha de um determinado local pode instalar agências e caixas eletrônicos dentro da repartição pública. "Quando se trata de pessoas físicas, estar fisicamente perto do cliente é importante", disse Sérgio Nazaré, diretor de clientes do Banco do Brasil.
Apesar disso, o Banco do Brasil não está disposto a entrar em novos leilões de folhas de pagamento neste momento. Dono da maior carteira de servidores do país, com 6,7 milhões de correntistas, vai se concentrar agora na manutenção da clientela que já tem ou na conquista dela.
A retenção dos correntistas também inquieta o Banrisul, banco que detém as folhas de pagamento do governo estadual e de 85% das 496 prefeituras do Rio Grande do Sul. "A portabilidade preocupa, mas temos produtos e serviços diferenciados para os servidores", afirmou Jone Pfeiff, diretor comercial do Banrisul. Num universo de 3 milhões de clientes, quase 500 mil são funcionários públicos que recebem seus salários pelo banco, sendo 354 mil estaduais e 140 mil municipais. Só a folha do governo do Estado - que controla o Banrisul - chega, em média, a R$ 1,1 bilhão brutos por mês.
Neste mês, segundo Pfeiff, a instituição começou a enviar correspondências com ofertas para esses clientes, incluindo limites mais altos de cheque especial, financiamento imobiliário e de veículos com prazos e taxas especiais, empréstimos consignados e cartões de crédito sem anuidade e com juros mais baixos.
Ninguém acredita, porém, que de uma hora para a outra milhares de clientes vão mudar de banco só por causa do início da portabilidade. "Funcionários da iniciativa privada já podem fazer isso, mas poucos efetivamente tiram proveito dessa alternativa. Precisa de um tempo. É como aconteceu com o celular", disse Coutinho, do Santander, referindo-se à portabilidade dos números de telefones entre as diferentes operadoras.
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
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